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↻ A precarização do trabalho na sociedade
contemporânea
“Outrora, havia uma massa de trabalhadores assalariados; hoje, há uma multidão de tra-
balhadores precarizados.”
NEGRI, Antonio; HARDT, Michael. Declaração: isto não é um manifesto. 2. ed. São Paulo: N-1 Edições, 2014. p. 23.
A afirmação dos filósofos Antonio Negri e Michael Hardt indica uma mu-
dança nas relações de trabalho no capitalismo entre a época analisada por
Marx e Comte e a atual. Na visão dos pensadores, o trabalho hoje está sendo
precarizado; mas o que isso significa? O capitalismo é um sistema econômico
baseado no trabalho assalariado e na extração da mais-valia, ou seja, em tra-
balho excedente não pago. Desde sua origem, esse sistema tem como objetivo
aumentar a produtividade e, consequentemente, o lucro, seja impondo um ritmo
de trabalho intenso ao trabalhador, seja pela introdução de novas tecnologias
no processo produtivo. No entanto, desde as origens do capitalismo, houve re-
sistência e luta contra esse sistema. O movimento dos trabalhadores, por meio
de manifestações, greves, rebeliões, revoluções e outras tantas formas de con-
fronto, estabeleceu limites a essa exploração. No início da Revolução Industrial,
na segunda metade do século XVIII, não existia legislação trabalhista e muito
menos direitos sociais, como férias, aposentadoria ou descanso remunerado.
Para se ter uma ideia, a jornada de trabalho variava entre 12 e 18 horas diárias
em ambientes insalubres e sem ventilação, e o trabalho de mulheres e crianças,
que recebiam menos que os homens, era comum.
Os trabalhadores, por meio de suas constantes mobilizações, conquistaram
gradualmente muitos direitos. Um exemplo disso são as lutas pela redução da
jornada de trabalho. Em 1866, no congresso da Associação Internacional dos
Trabalhadores, a limitação da jornada para 8 horas diárias era considerada
condição prévia para a melhoria das condições de vida da classe trabalhadora.
Na atual Constituição brasileira, promulgada em 1988, a jornada de trabalho
estabelecida é de 8 horas diárias e 44 horas semanais. Atualmente, procura-se
implementar jornadas cada vez mais flexíveis, que levam à precarização das
condições de trabalho.
↪ Redução de direitos
A precarização do trabalho se caracteriza pela diminuição de direitos e ga-
rantias conquistadas pelos trabalhadores, possibilitando sua superexploração.
Atividades fabris, de call center, limpeza, comércio, fast-food, supermercados
e diversas outras relacionadas à tecnologia da informação e da comunicação
são realizadas cada vez mais em regime de trabalho intermitente, temporá-
rio, autônomo e sem uma regularização social que proteja os trabalhadores. A
precarização corresponde à fase atual do capitalismo, na qual se procura au-
mentar a produtividade e a extração de mais-valia por meio de diversas formas
de exploração, tanto no processo direto de produção fabril quanto além dele.
Convivem – e, às vezes, combinam-se – relações de trabalho formais, regidas
por contratos, com aquelas caracterizadas pela informalidade. Um exemplo
dessa nova relação é o fenômeno da terceirização. DOC. 2
“[...] a terceirização vem se tornando a modalidade de gestão que assume centralidade na
estratégia empresarial, uma vez que as relações sociais estabelecidas entre capital e trabalho
são disfarçadas em relações interempresas, baseadas em contratos por tempo determinado,
flexíveis, de acordo com os ritmos produtivos das empresas contratantes, com consequências
profundas que desestruturam ainda mais a classe trabalhadora, seu tempo de trabalho e de
vida, seus direitos, suas condições de saúde, seu universo subjetivo etc.”
ANTUNES, Ricardo. O privilégio da servidão: o novo proletariado de serviços na era digital. São Paulo: Boitempo,
2018. Versão eletrônica.
As cadeias produtivas utilizam cada vez mais o trabalho terceirizado. A
maior empresa chinesa responsável pela montagem de produtos eletrônicos
230 UNIDADE 4: O MUNDO EM TRANSFORMAÇÃO