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Veja respostas e orientações         	↪	 A vontade de potência e o super-homem                                                                               FOCUS PIX/SHUTTERSTOCK
        no Manual do Professor.
                                                O racionalismo, com seus sistemas idealistas e metafísicos, e o cristianismo,
•	 Imagine que você encon-                com sua moral de resignação, haviam levado, segundo ele, à negação da vida e dos
                                          princípios vitais. Nietzsche, ao exaltar a vida, resgata o que acreditava ser a ten-
    trasse com Nietzsche e                dência ou o elemento fundamental da natureza humana: a vontade de potência.

    ele lhe fizesse a indagação                 Vontade de potência seria, para o filósofo, a energia da existência, a vontade
                                          de ser, de durar, de se desenvolver e intensificar a vida. À vontade de potência
    presente no texto a seguir.           estariam vinculadas todas as funções orgânicas (corporais ou mentais). Trata-se
                                          de um impulso ou de uma força para a vida, o mais forte de todos os instintos,
    O que você diria?                     que procuraria não só a sobrevivência, mas um ir além em todas as suas pos-
                                          sibilidades, como se fosse uma vontade de ser mais.
           “O maior dos pesos. –
    E se um dia, ou uma noite,                  Em sua obra A gaia ciência, Nietzsche anunciou a morte de Deus. O que o
    um demônio lhe aparecesse             filósofo quis dizer com essa afirmação?
    furtivamente em sua mais
    desolada solidão e disses-                  Ele estava anunciando o fim de um tempo, uma linha divisória na história
    se: “Esta vida, como você a           do homem, que até o século XIX estruturava seu mundo e sua vida com base
    está vivendo e já viveu, você         em verdades eternas e absolutas, na crença em um ser divino que estabelecia
    terá de viver mais uma vez            harmonia no Universo e justificava a tranquilidade dos homens em seu futuro
    e por incontáveis vezes; e            – ou seja, um ser cuja existência e valores davam sentido à vida.
    nada haverá de novo nela,
    mas cada dor e cada prazer                  Com a morte de Deus e com o fim das explicações sobrenaturais sobre a realidade
    e cada suspiro e pensamen-            terrena, na visão de Nietzsche desabava também o conjunto de valores que orienta-
    to, e tudo o que é inefavel-          vam o viver do ser humano. Segundo o filósofo, era chegada a hora de o indivíduo, ele
    mente grande e pequeno                mesmo, assumir o sentido de sua vida, sem subterfúgios, sem ilusões, sem o engodo
    em sua vida, terão de lhe             dos além-mundos, sem os valores morais que oprimiam os seus instintos.
    suceder novamente, tudo
    na mesma sequência e or-              ↑ O atleta jamaicano Usain Bolt cruza a linha de chegada e conquista a medalha de ouro na final dos 100
    dem – e assim também essa             metros rasos nos Jogos Olímpicos de Londres, na Grã-Bretanha, em 2012. Para Nietzsche, a vontade de
    aranha e esse luar entre as           potência é, entre outras coisas, uma energia da existência, uma busca por ir além de todas as possibilidades.
    árvores, e também esse ins-
    tante e eu mesmo. A perene                  Para a realização dessa tarefa que se vislumbrava no horizonte, era preci-
    ampulheta do existir será             so um ser humano de outro tipo, que fosse além do ser humano obediente e
    sempre virada novamente –             pessimista em relação à vida: um super-homem.
    e você com ela, partícula de
    poeira!’. – Você não se pros-                    “Somente agora dará à luz a montanha do futuro humano. Deus morreu: agora nós que-
    taria e rangeria os dentes e              remos que viva o super-homem.”
    amaldiçoaria o demônio
    que assim falou? Ou você                         NIETZSCHE, Friedrich. Assim falava Zaratustra. Trad. Eduardo Nunes Fonseca. São Paulo: Hemus, 1979. p. 218.
    já experimentou um ins-
    tante imenso, no qual lhe                   Esse super-homem, sobretudo, ama a vida e construirá o sentido de sua
    responderia: ‘Você é um               existência na sua natureza, na sua vontade de potência, apoiado não em um
    deus e jamais ouvi coisa tão          mundo celeste inexistente, mas na Terra e nas coisas terrenas, em seu corpo
    divina!’. Se esse pensamen-           e em seus instintos.
    to tomasse conta de você, tal
    como você é, ele o transfor-
    maria e o esmagaria talvez:
    a questão em tudo e em
    cada coisa, “Você quer isso
    mais uma vez e por incon-
    táveis vezes?’, pesaria sobre
    os seus atos como o maior
    dos pesos! Ou o quanto você
    teria de estar bem consigo
    mesmo e com a vida, para
    não desejar nada além des-
    sa última, eterna confirma-
    ção e chancela?”.

           NIETZSCHE, Friedrich. A gaia
     ciência. São Paulo: Companhia das

      Letras, 2012. Aforismo 341. p. 205

                                          CAPÍTULO 21: O HOMEM É MAIS DO QUE A RAZÃO: AS CONTESTAÇÕES DE SCHOPENHAUER, KIERKEGAARD E NIETZSCHE 267
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