Page 274 - PNLD 2026 - FILOSOFIA
P. 274

↻	O problema da linguagem e a filosofia analítica

      A busca pela clareza e pela compreensão do          		↪ A teoria das descrições
que se pensa e se diz impulsiona os estudos sobre a
linguagem. O matemático e filósofo alemão Gottlob               O filósofo, matemático e lógico galês Bertrand
Frege (1848-1925) foi, para muitos, o precursor da filo-  Russell (1872-1970) tinha muito interesse no estu-
sofia analítica. Entre suas contribuições para o estudo   do da linguagem. Influenciado pelas reflexões de
da linguagem, destaca-se a distinção entre sentido,       Frege, ele acreditava que muitas confusões de en-
referência e representação, registrada no texto Sobre     tendimento eram provocadas pelas formulações da
o sentido e a referência, de 1892.                        linguagem comum, ou seja, a linguagem utilizada no
                                                          cotidiano. Isso porque a linguagem que utilizamos
      Se digo “Esta maçã” mostrando um objeto, no-        no dia a dia não é completamente lógica.
meio esse objeto – no caso, a fruta. A expressão
“Esta maçã” é um sinal ou um nome que se refere                 Russell dedicou boa parte de sua obra à análi-
a determinada fruta. Há um sinal ou nome – “Esta          se da linguagem, buscando, por meio da decompo-
maçã” – e uma referência – a fruta. Contudo, essa         sição das sentenças, revelar suas estruturas lógicas.
fruta pode ser chamada de outros nomes, como              Segundo esse filósofo, haveria dois tipos de conhe-
“fruto da macieira” ou “maçã vermelha”. “Esta maçã        cimento: por familiaridade ou por descrição. O co-
vermelha” e “Este fruto da macieira” são dois si-         nhecimento por familiaridade seria obtido quando há
nais ou nomes para a mesma referência – a fruta –,        contato direto com as coisas. Assim, quando se olha
mas o modo de designação ou apresentação da fru-          para um objeto, apreendem-se os elementos mais
ta – o sentido – é diferente. No exemplo, há um ob-       simples, como a cor, a forma, a aspereza, o tamanho
jeto, a maçã, e dois sinais, cada um com um sentido       desse objeto. Só depois, com base na reunião ou na
específico, que carregam informações distintas: um        composição desses elementos, o objeto é reconhecido.
indica que a fruta é vermelha, e o outro, que ela é       Por exemplo, quando se está em frente a uma cadeira,
fruto de uma árvore – a macieira.                         imediatamente apreendem-se a cor, a forma, a textura
                                                          e outros dados sensíveis dela. Aqui o conhecimento se
	↪	 Valor objetivo do sentido e valor                     dá pela familiaridade. Uma vez adquirido o conheci-
    subjetivo da representação                            mento prévio dos dados sensíveis relacionados à ca-
                                                          deira, estes são utilizados para compor mentalmente
      Qualquer pessoa pode compreender a referên-         o objeto, conduzindo ao conhecimento por descrição.
cia e o sentido das expressões “esta maçã”, “fruto
da macieira” ou “maçã vermelha”. Dessa maneira,                 Grande parte do que expressamos nas frases,
o sentido não é algo subjetivo e pode ser compar-         sentenças ou afirmações é conhecimento por des-
tilhado entre os indivíduos. Outra coisa é a repre-       crição. Desse modo, na frase “A cadeira sob a mesa
sentação que cada indivíduo experimenta quando            está quebrada” há várias expressões, como “cadeira”
ouve a expressão “maçã vermelha”, por exemplo.            e “mesa” (conhecimento por descrição), que são cons-
Representação é uma imagem interna impregnada             tituídas por dados sensíveis diversos (conhecimento
de lembranças e experiências vividas, carregadas          por familiaridade).
ou não de emoções e de sentimentos. Cada sujei-
to tem a sua representação, que é completamente                 Russell acreditava que o conhecimento direto
subjetiva, pois é uma imagem interna concebida pelo       dos dados sensíveis era certo e seguro, pois não
indivíduo e, portanto, incomparável.                      apresentava nenhuma dúvida, enquanto o conheci-
                                                          mento por descrição poderia ser verdadeiro ou falso.
      Se os sentidos ou pensamentos são objetivos e       Por conseguinte, era preciso criar uma teoria ou um
podem ser expressos por sentenças ou afirmações,          método para investigar as afirmações presentes na
a filosofia, que busca comunicar ideias de modo cla-      linguagem. A teoria das descrições, criada por ele,
ro e preciso, deve ter como centro de preocupação a       foi esse método.
investigação da linguagem. Por meio dela, da análise
das afirmações ou proposições, do esclarecimento                Para o filósofo, as sentenças da linguagem deve-
do sentido e da referência dos nomes e das expres-        riam ser devidamente analisadas, quer dizer, decom-
sões que compõem as proposições, obtém-se cla-            postas até se chegar ao elemento linguístico que faz
reza sobre os pensamentos. Frege apontou o novo           referência ao elemento simples da realidade. Ou seja,
caminho da filosofia: a investigação semântica, isto      Russell pretendia, por meio da análise da linguagem,
é, o estudo do sentido ou significado das sentenças       chegar ao conhecimento seguro dos dados sensíveis.
ou dos enunciados. DOC. 1
                                                                Ele acreditava, então, que havia uma correspon-
                                                          dência entre os dados e a realidade do mundo, entre
                                                          o que ele chamava de signo atômico (a palavra ou
                                                          expressão simples) e o fato atômico (os elementos
                                                          básicos que constituem o mundo).

272 UNIDADE 5: O MUNDO EM CONFLITO
   269   270   271   272   273   274   275   276   277   278   279