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para a ciência; através da reflexão, ela localiza o problema tornando Sentir-se maravilhado significa pôr-se, essas perguntas. Hoje, em
possível sua delimitação na área de tal ou qual ciência que pode então geral, quem faz isso é o cientista. O qual se faz perguntas muito circuns-
analisá-lo e, quiçá, solucioná-lo. critas sobre uma determinada classe de fenômenos ou de eventos que
constituem objeto de sua pesquisa. Todavia, pode se sentir maravilhado
Além disso, enquanto a ciência isola o seu aspecto de contexto e o qualquer um de nós, quando, ao caminhar ou ao olhar em torno, vê sob
analisa separadamente, a filosofia, embora dirigindo-se às vezes apenas uma nova luz as coisas de todos os dias. Naturalmente, isso é muito raro
a uma parcela da realidade, insere-a no contexto e a examina em função de acontecer, porque habitualmente caminha-se com objetivos bem
do conjunto. A exposição sumária e isolada de cada um dos itens acima precisos, para ir a algum lugar, para fazer certa coisa, e se dá atenção
descritos não nos deve iludir. Não se trata de categorias autossuficientes somente às coisas que servem a nossos objetivos. Todavia, às vezes,
que se justapõem num somatório suscetível de caracterizar, pelo efeito pode acontecer de olharmos o mundo de modo diferente, de ficarmos
mágico de sua junção, a reflexão filosófica. maravilhados por estarem as coisas de certo modo. [...]
A profundidade (radicalidade) é essencial à atitude filosófica BERTI, Enrico. No princípio era a maravilha. São Paulo: Loyola, 2010.
do mesmo modo que a visão de conjunto. Ambas se relacionam diale- p. 12-13.
ticamente por virtude da íntima conexão que mantêm com o mesmo
movimento metodológico, cujo rigor (criticidade) garante ao mesmo Texto 3
tempo a radicalidade, a universalidade e a unidade da reflexão filosófica. Nesse trecho de texto, o filósofo Mario Porta reforça a ideia
[...] é necessária uma observação sobre a expressão bastante difundida, de que a filosofia tem uma dinâmica própria baseada em proble-
‘problema filosófico’. mas e soluções. Entender um filósofo ou uma corrente filosófica
significa compreender qual é o problema que se está tentando
Cabe perguntar: ‘existem problemas que não são filosóficos?’. Na responder e qual é a resposta. Este escrito pode servir de apoio
verdade, um problema, em si, não é filosófico, nem científico, artístico para o aluno aprofundar reflexões sobre a filosofia.
ou religioso. A atitude que o homem toma perante os problemas é que
é filosófica, científica, artística ou religiosa ou de mero bom senso. A O núcleo da filosofia: problemas e soluções
expressão que estamos analisando é resultante, pois, do uso corrente
da palavra problema [...] que a dá como sinônimo de questão, tema, “A filosofia é vista como um espaço onde reina o capricho, poden-
assunto. Aqueles assuntos, que são objeto de estudo dos cientistas, por do cada um dizer o que quiser. Seu caráter não-empírico é entendido
exemplo, são denominados ‘problemas científicos’. Daí as derivações como pura arbitrariedade, quando não como confusão crônica. Porém,
‘problemas sociológicos’, ‘problemas psicológicos’, ‘problemas químicos’ essa impressão é falsa: a filosofia não é um caos de pontos de vistas
etc. Mas como aceitar essa interpretação no caso da filosofia, que, como incomensuráveis, nem consiste simplesmente em possuir certezas.
foi dito antes, não tem objeto determinado? Como aceitá-la, se qualquer Trata-se de ter opiniões sobre certos temas bem definidos e sustentá-
assunto pode ser objeto de reflexão filosófica? O uso comum e corrente -las em algo diferente de uma convicção pessoal; mais ainda, o núcleo
tem se pautado, então, pelo seguinte paralelismo: assim como ‘proble- essencial da filosofia não é constituído de crenças sistematicamente
mas científicos’ são aquelas questões de que se ocupam os cientistas, definidas e racionalmente fundadas senão de problemas e soluções.
‘problemas filosóficos’ não são outra coisa senão aquelas questões de
que se têm ocupado os filósofos. Não se deve esquecer, porém, que Se o público em geral não entende o que os filósofos fazem e
não é porque os filósofos se ocuparam com tais assuntos que eles são crê que cada um simplesmente diz o que quer, isso se deve, em grande
problemas; mas, ao contrário: é porque eles são (ou foram) problemas medida, ao fato de que não entende o problema ou, mais ainda, não toma
que os filósofos se ocuparam e se preocuparam com eles. Resta, en- consciência da existência de um problema. Esse é o dado da equação
tão, a seguinte alternativa: a expressão ‘problemas filosóficos’ é uma que tende a faltar e o motivo essencial da impressão de arbitrariedade.
manifestação corrente da linguagem e, como fenômeno, ao mesmo O que o filósofo diz é tomado como ‘mero dizer’ como ‘irresponsável
tempo revela e oculta a essência do filosofar. Oculta, na medida em que afirmar’ passando-se por alto seu originário caráter de ‘solução’. No
compartimentalizando também a atitude filosófica (bem ao gosto do entanto a filosofia possui problemas, sendo a unidade dinâmica interna
modo formalista de pensar) a reduz a uns tantos assuntos já de antemão desses problemas o que está na base da multiplicidade e da mudança
catalogáveis, empobrecendo um trabalho que deveria ser essencialmente de temas e opiniões. Quando não há problema tampouco há filosofia.”
criador. Revela, enquanto pode chamar a atenção para alguns proble-
mas que se revestem de tamanha magnitude, em face das condições PORTA, Mario Ariel González. A filosofia a partir de seus problemas. São
concretas em que o homem produz a sua existência, que exigem, em Paulo: Loyola, 2002. p. 25-26.
caráter prioritário, uma reflexão radical, rigorosa e de conjunto. Tratar-
-se-ia, por conseguinte, de problema que põe em tela, de imediato e de RESPOSTAS E COMENTÁRIOS DAS ATIVIDADES DO LIVRO DO ESTUDANTE
modo inconteste, a necessidade da filosofia. Estaria justificado, nessas
circunstâncias, o uso da expressão ‘problema filosófico’.” QUESTÃO (P. 57)
A reflexão sobre o trecho citado, no qual Sócrates discorre a
SAVIANI, Dermeval. Educação: do senso comum à consciência filosófica.
Campinas: Autores Associados, 2009. p. 29-33. respeito do convite que faz aos homens para cultivarem a própria
alma, coloca em questão a preocupação com a boa vida e com os
Texto 2 valores que devem norteá-la. Os estudantes podem concordar ou
discordar, total ou parcialmente, da posição de Sócrates. O impor-
O escrito de Enrico Berti chama a atenção para o aspecto tante é que justifiquem suas posições com argumentos coerentes.
cognitivo do estranhamernto que origina as reflexões filosóficas.
O autor separa a admiração estética do desejo de saber típico QUESTÕES (P. 58)
da filosofia. É um texto complementar que pode ajudar o aluno 1) Os dois estão utilizando o termo “valores” com sentidos
a compreender de maneira mais profunda o que foi tratado no diferentes. Mafalda se refere a valores humanos (morais,
capítulo 2 em volta da pergunta: O que é filosofia? artísticos, espirituais); enquanto Manolito pensa na Bolsa
de Valores, isto é, em bens materiais.
No princípio era a maravilha 2) Resposta livre. No entanto, depois do estudo realizado nesse
capítulo, espera-se que os estudantes tenham percebi-
“Já a maravilha de que falam Platão e Aristóteles não tem nada do a importância dos valores humanos e não comunguem
de estético, é uma atitude puramente teorética, ou seja, cognosciva, é com a posição de Manolito. Além disso, qualquer que seja
simples desejo de saber. Mas de saber o quê? O ‘porquê’ ou a explicação a posição tomada, ela deve ser fundamentada de maneira
do que está diante de nós e de que não se vê imediatamente a causa. argumentativa.
A maravilha é essencialmente pergunta de uma explicação, de uma
razão: ela nasce da experiência, da observação de um objeto, de um QUESTÃO (P. 60)
acontecimento ou de uma ação de que se quer conhecer o porquê, Resposta pessoal. Trata-se de um estímulo (sensibilização) à
ou seja, a causa. A esse propósito, não se deve entender o conceito de
causa no sentido moderno de evento que produz outro evento a ele reflexão sobre os problemas presentes na sociedade tecnológica.
posterior. Essa é a causa de tipo mecânico, que Aristóteles teria chamado Além disso, será um ganho muito importante se os estudantes
de ‘causa motriz’ ou ‘eficiente’. O porquê oi a causa no sentido antigo propuserem alguma ação em relação ao problema selecionado.
é qualquer tipo de explicação: por exemplo, se se trata de explicar um
objeto, pergunta-se de que coisa é feito, por que é feito de certo modo e
não de outro, quem o fez, para que serve. Ou., se se trata de um evento,
pergunta-se por que aconteceu, o que o provocou, porque se apresentou
daquele modo e não de outro, que consequências ele pode ter, a que
fins pode estar voltado.
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