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↪ O poder judicial dos senhores feudais

Direito consuetudinário: código de leis        Durante o período feudal, prevaleceram normas baseadas nos costumes
de um povo construído com base nos       e transmitidas pela tradição oral. Muitas dessas normas tinham origem nas
costumes, transmitidos de geração        capitulares, leis escritas e editadas pelos imperadores francos, principalmente
em geração, que passou a ser aceito      Carlos Magno. Porém, com a fragmentação política, essas leis desapareceram.
como norma.                              Algumas delas, no entanto, foram incorporadas, de forma fragmentada e difusa,
                                         ao direito consuetudinário, interpretadas e aplicadas de diferentes maneiras em
LO SPAGNOLETTO/MUSEU DO PRADO, ESPANHA   cada reino ou domínio senhorial.

                                               Na época carolíngia, por exemplo, apenas os tribunais presididos por um
                                         conde, um servidor do império, podiam exercer a alta justiça, que julgava os
                                         crimes mais graves e tinha poder de aplicar a pena de morte e reduzir uma
                                         pessoa à escravidão. Mais tarde, diante da fraqueza do Estado, vários senhores
                                         assumiram a prerrogativa de aplicar a pena capital, além da Igreja, que exerceu a
                                         justiça da violência com a autoridade que a religião cristã conquistou entre reis,
                                         senhores e camponeses. Havia também a baixa justiça, voltada ao julgamento
                                         das demais questões.

                                               Na época feudal, muitos conflitos eram resolvidos em duelos, vistos como
                                         instrumentos em defesa da honra. Mesmo tendo sido proibidos mais tarde,
                                         os duelos sobreviveram nas camadas da nobreza europeia até o século XIX e,
                                         em algumas regiões, pode-se afirmar que não desapareceram por completo.
                                         Associado à vocação guerreira da nobreza, o duelo era praticado também por
                                         mulheres.

                                                    “Lá estão eles, seus cavalos relinchando na poeira enevoada da praça, o sol brilhando em
                                             seus capacetes. Um deles adornado com diamantes e o outro com uma serpente dourada. Estamos
                                             em 1552, um belo dia de maio como qualquer outro em Nápoles, mas um dia que será lembrado
                                             por muito tempo. Esse é o dia em que as duas mulheres nobres se enfrentaram em trajes de
                                             guerra completos pelo amor compartilhado de Fabio de Zeresola, um homem perigosamente
                                             popular entre as damas. Isabella Dè Carazzi e Diambra Dè Pottinella eram amigas, até o dia em
                                             que uma reunião social colocou as três na mesma mesa. Quando Isabella viu o olhar que Fabio
                                             lançou para Diambra, ela percebeu. Sem hesitar, ela desafiou sua ex-amiga e a discussão se
                                             intensificou rapidamente. [...] Seis dias depois, o duelo se tornou o evento social do ano. Toda a

                                                                                    corte de Nápoles estava presente, inclusive o marquês de Pescara
                                                                                    e futuro governador de Milão [...], misturando-se com pessoas
                                                                                    comuns que suspenderam suas tarefas diárias para a ocasião.
                                                                                    Os duelos não eram uma ocorrência diária, mas o fato de duas
                                                                                    mulheres lutarem por um homem era algo inédito.”

                                                                                                O DUELO de Isabella e Diambra. Malleus Martialis Firenze. Disponível em:
                                                                                                   https://www.malleusmartialis.com/the-duel-of-isabella-and-diambra/.
                                                                                                                                    Acesso em: 9 out. 2024. (Tradução nossa.)

↑ Detalhe da pintura Duelo de mulheres, do pintor valenciano José de        Nessa época de senhorialização da justiça, os
Ribera, o Spanoletto, 1636.                                           castelos se transformaram em símbolos do poder
                                                                      e da autonomia dos senhores feudais. Tais edifica-
                                                                      ções eram mais que a moradia dos senhores e de
                                                                      sua família: eram áreas entrincheiradas, nas quais
                                                                      o senhor atuava como juiz. Os primeiros castelos
                                                                      começaram a ser construídos durante as invasões
                                                                      vikings e húngaras, no século IX, por ordens do rei
                                                                      ou de seus representantes locais. Com o tempo,
                                                                      porém, o monopólio real de fortificação se perdeu
                                                                      completamente, e os castelos se disseminaram pelo
                                                                      Ocidente europeu como expressão do poder político
                                                                      e militar dos senhores feudais.

                                                                      CAPÍTULO 14:  DAS MONARQUIAS FEUDAIS AO ESTADO MODERNO 175
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