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Androcêntrico: adepto do androcen-                 ↻	A mulher na Idade Média
trismo, tendência a desvalorizar as
ideias e experiências relacionadas ao                    A visão negativa sobre as mulheres, disseminada no mundo greco-romano,
sexo feminino e a assumir o modelo                 foi incorporada pela comunidade cristã. Os principais propagadores dessa imagem
masculino como padrão para toda a                  da figura feminina foram os representantes da Patrística, movimento de padres
sociedade.                                         da Igreja, surgido no século I, que procurava formular e defender a doutrina cristã
                                                   dos ataques de grupos pagãos e do Estado romano.
Pecado original: refere-se ao pecado
de desobediência cometido por Adão                       Em diferentes proporções e intensidades, os pensadores da Igreja adotaram
e Eva no Paraíso e narrado no livro                uma postura androcêntrica, em que as mulheres eram vistas como um repo-
Gênesis, da Bíblia. Segundo a doutri-              sitório de vícios: vaidade, incontinência verbal, futilidade e traição. O escritor
na católica, o pecado de Adão e Eva                cartaginês convertido ao cristianismo Tertuliano (160-220 d.C.), por exemplo,
foi transmitido a todas as gerações                defendia com veemência um padrão feminino de conduta com base no recato, na
e só pode ser redimido por meio do                 submissão ao marido e em uma vida voltada para a religião. Só assim, segundo
batismo.                                           ele, as mulheres seriam redimidas do pecado original.

A associação entre mulher, sexo e                        É preciso destacar, porém, que essa visão negativa das mulheres predo-
pecado original se consolidou na                   minava nos círculos da Igreja e da alta nobreza. Mulheres curandeiras, que
Idade Média. Não por acaso, no                     também exerciam o ofício de parteiras e enfermeiras, tinham grande prestígio
II Concílio de Latrão, realizado                   nas comunidades camponesas. Algumas mulheres se notabilizaram por exercer
no século XII, o celibato clerical, até            importantes funções, como abadessas, rainhas e dirigentes de senhorios. A
então recomendado pela Igreja, foi                 partir do século XI, com a expansão do comércio e dos centros urbanos, cada
transformado em regra.                             vez mais as mulheres passaram a ser vistas como chefes de negócios nas ci-
                                                   dades mais ativas.
                            DIÁLOGO COM FILOSOFIA
                                                         No final do século XIII, os debates a respeito da divindade de Maria mobili-
                                                   zaram importantes teólogos da Escolástica, filosofia cristã que retomou e am-
                                                   pliou as ideias desenvolvidas pela Patrística. Difundido nas escolas cristãs, esse
                                                   movimento intelectual validou as bases do culto à mãe de Jesus. Apresentaram
                                                   Maria como uma nova Eva, livre do pecado, e sua virgindade passou a ser valo-
                                                   rizada como uma forma de consagração a Deus. Nessa perspectiva teológica,
                                                   a mulher deixou de ser vista como a encarnação do mal para ser considerada
                                                   parte preciosa da criação divina.

                                                         Se por um lado a valorização de Maria redimia a mulher do pecado original,
                                                   por outro criava uma visão idealizada da figura feminina. A mulher cristã devia
                                                   moldar sua conduta à imagem da Virgem: deveria ser pura, sem pecado, dócil
                                                   e dedicada a cuidar do marido e da família, assim como Maria dedicou sua vida
                                                   a Deus e a seu filho Jesus.

                                                         A mulher continuava sendo uma projeção do pensamento masculino. Ela
                                                   teve de trilhar um longo percurso para se autoproclamar um ser autônomo, ca-
                                                   paz de fazer suas próprias escolhas. A luta feminina por autonomia, identidade
                                                   e direitos ainda está em curso no século XXI.

                                                                                                                                        MUSÉE DES BEAUX-ARTS DE ROUE

       → A Virgem entre as virgens,
       pintura do flamengo Gerard
       David, 1509. Essa imagem
       representa com nitidez a imagem
       da mulher como Maria, a mãe
       de Jesus. Note que todas as
       mulheres se assemelham,
       na aparência, no modo de se
       vestir e na postura, com Maria,
       representada com o menino
       Jesus no colo, no centro da
       pintura.

90 UNIDADE 2: O MUNDO EM MOVIMENTO
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