Page 88 - PNLD 2026 - FILOSOFIA
P. 88
Nobilitante: que enobrece, dignifica. O que pensou Aristóteles sobre as práticas humanas? O trecho a seguir,
retirado da obra Ética a Nicômaco, pode nos ajudar a responder a essa pergunta.
“Se há, então, para as ações que praticamos, alguma finalidade que desejamos por si mesma,
sendo tudo mais desejado por causa dela, e se não escolhemos tudo por causa de algo mais... eviden‑
temente tal finalidade deve ser o bem e o melhor dos bens. Não terá então uma grande influência
sobre a vida o conhecimento do bem? Não deveremos, como arqueiros que visam um alvo, ter maiores
probabilidades de atingir assim o que nos é mais conveniente? [...] cumpre-nos tentar determinar,
mesmo sumariamente, o que é este bem, e de que ciências ou atividades ele é objeto.
[...] Ainda que a finalidade seja a mesma para um homem isoladamente e para uma ci‑
dade, a finalidade da cidade parece de qualquer modo algo maior e mais complexo, seja para a
atingirmos, seja para a perseguirmos; embora seja desejável atingir a finalidade apenas para um
único homem, é mais nobilitante e mais divino atingi-la para uma nação ou para as cidades.”
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Nova Cultural, 1996. p. 118-119. (Coleção Os Pensadores).
Felicidade: o bem supremo
O argumento desenvolvido por Aristóteles no primeiro parágrafo do trecho
citado pode ser assim organizado:
1. Se há uma causa final relacionada às ações humanas, deve ser um bem,
pois nossas ações sempre visam a um bem.
2. Esse deve ser o melhor dos bens, pois é a causa final de todos os outros.
3. Então, o conhecimento do melhor dos bens tem muita influência e im-
portância sobre a vida e as ações humanas, pois, após conhecê-lo, é mais fácil
agir adequadamente para atingi-lo.
4. Disso decorre a importância de investigar esse melhor dos bens ou essa
causa final.
Mas qual é o melhor de todos os bens para os seres humanos? Na mesma
obra, um pouco mais à frente, o filósofo esclareceu:
“Retomando nossa investigação, e diante do fato de todo conhecimento e todo pro‑
pósito visarem a algum bem, falaremos daquilo que consideramos a finalidade da ciência
política, e do mais alto de todos os bens a que pode levar a ação. Em palavras, o acordo
quanto a este ponto é quase geral; tanto a maioria dos homens quanto as pessoas mais
qualificadas dizem que este bem supremo é a felicidade, e consideram que viver bem e ir
bem equivale a ser feliz [...].”
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. São Paulo: Nova Cultural, 1996. p. 120. (Coleção Os Pensadores).
Aristóteles quis dizer, nesse texto, que o bem supremo, ao qual todos os
outros estariam subordinados, seria a felicidade. Viver bem seria a mesma
coisa que ser feliz. Como, para ele, o ser humano, além de racional, é um ser
social ou político, que só se realiza vivendo na pólis, a felicidade individual e
a coletiva coincidiriam.
2023 RIDO/SHUTTERSTOCK De modo coerente com sua sis-
tematização do saber, Aristóteles
estabeleceu como campo de co-
nhecimento específico o que ele
chamou de “filosofia das coisas
humanas”, conferindo-lhe um tra-
tamento diferente do atribuído às
outras ciências (as teoréticas e as
produtivas). Na “filosofia das coisas
humanas”, seriam tratadas as ativi-
dades morais do indivíduo, sua con-
duta. O filósofo dividiu esse campo
de estudo em duas ciências: ética e
política. A ética trataria das ações
humanas individuais, as quais es-
tariam subordinadas ao bem cole-
tivo ou à felicidade coletiva, que se
realizaria na vida da pólis. A política
↑ A felicidade sempre foi uma preocupação humana, mas o que é a felicidade? Para seria a reflexão sobre o Estado e a
Aristóteles, era o bem supremo ao qual todos os outros estão subordinados. vida na comunidade. DOC. 1
86 UNIDADE 2: O MUNDO EM MOVIMENTO