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↻	O “nascimento” do Brasil: monárquico e escravista

      O termo “nascimento”, aqui, não é mero acaso.              Um dos debates mais intensos no período que
Afinal, só podemos falar em Brasil como uma uni-           antecedeu a outorga da Constituição foi sobre a defi-
dade política após a independência e a finalização         nição de quem seriam os “cidadãos” do novo império.
de intensos conflitos que surgiram a partir desse          O termo havia ganhado enorme relevância política
processo. Em 1818, dois anos após a morte de sua           com os movimentos constitucionais do século XIX, já
mãe, D. Maria I, D. João foi aclamado rei do Reino         que expressava a necessidade de delimitar aqueles
Unido de Portugal, Brasil e Algarves, com o título         que desfrutariam de “direitos civis” – propriedade,
de D. João VI. Mas o seu reinado já se iniciou tur-        liberdade de expressão e de ir e vir, inviolabilidade do
bulento. Em Portugal, setores descontentes com as          domicílio, entre outros – e de “direitos políticos” –,
liberdades econômicas concedidas ao Brasil e com           isto é, o direito ao voto e a se candidatar aos cargos
a ausência do rei organizaram um movimento que             políticos. Essa questão se chocava com a formação
exigia o retorno imediato do monarca a Lisboa.             multiétnica do país: como definir critérios de cidada-
                                                           nia em uma sociedade escravista e com uma imensa
      A chamada Revolução do Porto, que eclodiu em         população nativa que vivia no território, mas que não
1820, incorporava os novos valores liberais e propu-       tinha sido incorporada ao Império do Brasil?
nha a elaboração de uma Constituição para limitar
os poderes do rei, bem como para garantir os direi-              No texto da carta constitucional, acabou preva-
tos dos cidadãos, mostrando que a onda revolucio-          lecendo que seriam “cidadãos brasileiros” todos os
nária e liberal que atingia a Europa havia chegado         “que no Brasil tiverem nascido, quer sejam ingênuos ou
a Portugal. O liberalismo da revolução portugue-           libertos” (artigo 6º). Aparentemente, poderíamos dizer
sa tinha, porém, outro lado, alinhado com o Antigo         que esse era um critério inclusivo, já que admitia que
Regime, já que dava sinais de pretender anular as          todos os que fossem libertados do cativeiro seriam
liberdades comerciais concedidas ao Brasil durante         considerados cidadãos. Mas o fato de excluir do direito
o governo de D. João.                                      à cidadania todos aqueles que não tivessem nasci-
                                                           do no Brasil, a exemplo dos milhares de africanos, e
      D. João, no Rio de Janeiro, viu-se obrigado a acei-  de admitir a prática da escravidão ao mencionar os
tar as exigências do movimento e partiu para Lisboa        libertos demonstra o caráter conservador da primei-
em abril de 1821, deixando seu filho Pedro como prín-      ra Constituição brasileira. A carta constitucional não
cipe regente. A solução atendia a interesses de pro-       fazia nenhuma menção os indígenas; mas os debates
prietários de terra e grandes comerciantes que haviam      da época deixavam claro: os que não faziam parte
se fortalecido com a presença da corte na América, os      do “pacto social” não seriam cidadãos. Sendo assim,
quais começaram a gestar um projeto de separação do        durante todo o império prevaleceu a ideia de que os
Brasil. Esse projeto nascia efetivamente de setores da     indígenas eram tutelados pelo Estado.
elite colonial das províncias de São Paulo e de Minas
Gerais, além do Rio de Janeiro.                                                      Veja respostas e orientações

      O novo projeto previa a construção de uma mo-          	QUESTÕES no Manual do Professor.
narquia constitucional, sob o comando do príncipe
Pedro, mantendo a centralidade do Rio de Janeiro. Foi      1.	 Qual é a definição de cidadão, de acordo com os movi-
nesses moldes que a independência foi proclamada,              mentos constitucionais do início do século XIX?
em 7 de setembro de 1822. Ela refletiu os interesses
das elites políticas e econômicas do Centro-Sul. Por       2.	 Na Constituição de 1824, dois critérios fundamentais deli-
isso, era urgente conseguir a adesão das demais pro-           mitavam quem poderia ou não ser cidadão no Brasil: não
víncias ao Estado recém-criado e o reconhecimento              ser escravizado e ter nascido no país. Para além da lei, havia
internacional, bem como promover a criação de um               sua aplicação prática: quem não fizesse parte do “pacto
sentimento de identidade nacional entre os habitantes          social” também não teria acesso à cidadania. Explique o
do país.                                                       que aconteceu às populações africanas, afrodescenden-
                                                               tes e indígenas, considerando essa determinação da lei.
	↪	 A cidadania na Constituição de 1824
                                                           3.	 A Constituição de 1824 estabeleceu o catolicismo como
      A primeira Constituição do Brasil foi elaborada          crença oficial do Brasil, ainda que tenha garantido liberdade
por um Conselho de Estado, por ordens de D. Pedro              de culto a outras crenças. O que na prática significou ao
I e de acordo com os interesses do imperador.                  país ter a Igreja de Roma como denominação cristã oficial?

      A Constituição de 1824, apesar de sugerir a cons-    Outorgado: concedido; porém, quando se diz que uma Constituição foi outorgada
trução de um regime liberal, foi outorgada pelo impe-      significa que ela foi imposta por um soberano ou por um governante autoritário.
rador e destacou-se pela criação do Poder Moderador,
que permitia a D. Pedro intervir livremente nos outros     Ingênuo: nesse contexto, refere-se ao indivíduo nascido livre.
poderes, garantindo-lhe amplo controle sobre todas
as esferas do império.                                     Tutelado: aquele que, devido a alguma incapacidade de fato ou presumida, deve
                                                           ser amparado e protegido por outrem (o tutor).

260 UNIDADE 4: O MUNDO EM TRANSFORMAÇÃO
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