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↻ Hume: as impressões sensíveis e a natureza humana
Um dos principais objetivos do filósofo e histo‑ primeiras são aquelas que não admitem nenhuma CARLTON ALFRED SMITH ‑ COLEÇÃO PARTICULAR
riador escocês David Hume (1711‑1776) foi investigar separação, como a de cor vermelha; as complexas
a natureza humana. Para tanto, Hume estudou em podem ser distinguidas em partes, como a de maçã,
primeiro lugar o conhecimento humano. Influenciado que pode ser separada em cor, sabor e aroma.
pelo ambiente teórico e científico da época, assim
como Locke e Berkeley, procurou determinar as pos‑ ↑ Recordando o passado (1888), aquarela de Carlton Alfred Smith.
sibilidades, os limites e a extensão da capacidade Quando relembramos o passado, transformamos em ideia algo que
do ser humano de entender a realidade. anteriormente foi uma impressão.
Para desenvolver suas investigações sobre o co‑ Com base nesses elementos – impressões,
nhecimento humano, Hume teve como referência ideias e suas relações –, Hume buscou conhecer as
o avanço das ciências naturais, principalmente da regras de associação do pensamento e explicar o
física newtoniana. Assim como a mecânica de Isaac entendimento humano sobre o mundo.
Newton explicava os fenômenos naturais por meio
de princípios simples, com base nos quais estabe‑ A influência das investigações científicas do
lecia ordem na natureza, Hume buscava os princí‑ século XVII
pios que ordenavam os acontecimentos naturais da
mente: as ideias e os pensamentos. Os filósofos empiristas estudados neste ca‑
pítulo foram influenciados pelo desenvolvimen‑
Quais são as regras de associação das ideias? to das ciências naturais do século XVII e início
Que tipos de ideia existem? O que é impressão sen‑ do século XVIII, responsável por fundar a ciência
sível? O que é imaginação? Essas perguntas fizeram moderna. O modelo de investigação instituído
parte da reflexão de Hume. Segundo sua filosofia, as por diversos cientistas, em especial por Galileu
respostas a indagações como essas só podem ser Galilei e por Isaac Newton, baseava-se, entre ou‑
dadas de maneira consequente, mediante a aplica‑ tros princípios, na observação e na experimenta‑
ção do método experimental ao estudo da mente ção. Hume buscou utilizar, nas ciências humanas,
humana. Vejamos alguns aspectos de sua teoria do essa metodologia até então bem-sucedida nas
conhecimento. ciências naturais.
“As percepções da mente humana se reduzem a dois
gêneros distintos, que chamarei de impressões e ideias. A
diferença entre estas consiste nos graus de força e vividez
com que atingem a mente e penetram em nosso pensamento
ou consciência. As percepções que entram com mais força
e violência podem ser chamadas de impressões; sob esse
termo incluo todas as nossas sensações, paixões e emoções,
em sua primeira aparição à alma. Denomino ideias as pálidas
imagens dessas impressões no pensamento e no raciocí‑
nio, como, por exemplo, todas as percepções despertadas
pelo presente discurso, excetuando‑se igualmente o prazer
e desprazer imediatos que esse mesmo discurso possa oca‑
sionar. Creio que não serão necessárias muitas palavras para
explicar essa distinção. Cada um, por si mesmo, percebe
imediatamente a diferença entre sentir e pensar.”
HUME, David. Tratado da natureza humana: uma tentativa de introduzir
o método experimental de raciocínio nos assuntos morais. São Paulo:
Editora Unesp/Imprensa Oficial do Estado, 2001. p. 25.
As percepções da mente humana se reduzem,
então, a dois gêneros: impressões e ideias. O crité‑
rio que os distingue é o da nitidez. As impressões,
como as sensações, as paixões e as emoções, são
mais fortes e nítidas, constituindo uma espécie de
dado elementar e imediato, enquanto as ideias são
imagens ou cópias das impressões, presentes no
pensamento ou raciocínio.
Por exemplo, a paixão, no momento em que é
sentida, é uma impressão; a lembrança de uma anti‑
ga paixão é uma ideia; a percepção imediata de uma
maçã é uma impressão; a imagem de uma maçã
evocada pela palavra maçã é uma ideia. Além disso,
as percepções podem ser simples ou complexas. As
154 UNIDADE 3:O MUNDO QUE CONHECEMOS