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Uma passagem da obra Óptica, na qualDORLING KINDERSLEY/UIG/BRIDGEMAN IMAGES/KEYSTONE BRASIL ‑ COLEÇÃO PARTICULAR“Quanto às impressões provenientes dos sentidos, sua
  Newton trata do método científico, pode explicar                                         causa última é, em minha opinião, inteiramente inexplicável
  as características dessa metodologia:                                                    pela razão humana, e será para sempre impossível decidir
                                                                                           com certeza se elas surgem imediatamente do objeto, se são
             “Como na matemática, assim também na filosofia                                produzidas pelo poder criativo da mente, ou ainda se derivam
       natural, a investigação de coisas difíceis pelo método de                           do autor de nosso ser. Tal questão, diga‑se de passagem, não
       análise deve sempre preceder o método de composição.                                tem nenhuma importância para nosso propósito presente.
       Esta análise consiste em fazer experimentos e observa-                              Podemos fazer inferências partindo da coerência de nossas
       ções, e em traçar conclusões gerais deles por indução,                              percepções, sejam estas verdadeiras ou falsas, representem
       não se admitindo nenhuma objeção às conclusões, senão                               elas a natureza de maneira correta ou sejam meras ilusões
       aquelas que são tomadas dos experimentos [...]. Pois as                             dos sentidos.”
       hipóteses não devem ser levadas em conta em filosofia
       experimental.”                                                                        HUME, David. Tratado da natureza humana: uma tentativa de introduzir
                                                                                               o método experimental de raciocínio nos assuntos morais. São Paulo:
            NEWTON, Isaac. Óptica. São Paulo: Nova Cultural, 1996. p. 297‑298.                                   Editora Unesp/Imprensa Oficial do Estado, 2001. p. 113.
                                                             (Coleção Os Pensadores).
                                                                                             Sua explicação é simples: não é possível saber.
                                                      ← Réplica de disco               As impressões das sensações surgiriam na mente,
                                                      de Newton do século              mas sua causa seria desconhecida. A origem das
                                                      XVII. Esse dispositivo           impressões da sensação estaria, portanto, além da
                                                      é utilizado em                   experiência e além do entendimento humano. Locke
                                                      demonstrações de                 e Berkeley teriam se equivocado ao tentar explicar
                                                      composição de cores.             algo que não poderia ser explicado, pois a causa da
                                                      Ao ser movimentado               sensação não poderia ser conhecida pelo entendi-
                                                      rapidamente, o disco             mento humano.
                                                      aparenta ter a cor branca.
                                                      Em suas pesquisas de             		↪ Crítica ao princípio de
                                                      ótica, Newton verificou              causalidade
                                                      que a luz branca era
                                                      formada por uma série de               Talvez a reflexão sobre o princípio da causali-
                                                      cores.                           dade seja um dos aspectos mais comentados das
                                                                                       ideias de Hume. Essa reflexão influenciou muitos
		↪ Limite do entendimento humano                                                      pensadores, entre eles o alemão Immanuel Kant
                                                                                       (1724‑1804). Para entender a ideia de Hume sobre
      Se comparada ao pensamento de Locke e de                                         esse assunto, é preciso ter em conta os conceitos
Berkeley, a teoria de Hume apresenta um empiris-                                       de causalidade e de necessidade.
mo mais rigoroso. O filósofo se opunha a qualquer
concepção metafísica ou ideia que buscasse expli-                                            Para a maioria das pessoas, toda mudança
cações da realidade além da experiência sensível.                                      ocorrida na natureza tem uma causa. Pode‑se afir-
Lembremo‑nos de que Locke supôs a existência                                           mar, por exemplo, que a queda de uma árvore é
de substâncias materiais que seriam a causa das                                        causada por um raio ou que a elevação do nível de
ideias simples, ou seja, admitia em sua argumen-                                       um rio decorre do aumento das chuvas em deter-
tação algo que estaria além da experiência ou das                                      minado período. De alguma maneira, sempre se es-
ideias. Berkeley negava a existência de qualquer                                       tabelece uma relação causal entre dois eventos ou
substância material, mas introduziu a existência de                                    acontecimentos. Um é considerado a causa; o outro,
substâncias espirituais – que perceberiam as ideias                                    o efeito. Essa relação entre as coisas é considerada
– e de Deus, causa de todas as sensações. Esses                                        obrigatória – isto é, necessária – e está fundamen-
elementos também ultrapassavam a experiência.                                          tada no princípio da causalidade, segundo o qual
Hume não aceitava nenhuma dessas explicações.                                          todo acontecimento tem uma causa.

      Contudo, se na teoria de Hume a causa das                                              Mas Hume se contrapôs a essa ideia. A expe-
impressões sensíveis não eram as coisas materiais                                      riência pode nos informar de uma conjugação cons-
e concretas, como dizia Locke, nem Deus, como                                          tante entre dois eventos. Sabemos que, todas as ve-
afirmava Berkeley, de onde elas viriam ou como se                                      zes que aproximamos nossa mão de uma chama, por
manifestariam na mente humana?                                                         exemplo, temos a sensação de calor. Recordamos
                                                                                       que essa conjugação entre chama e calor sempre
                                                                                       se repete. A partir de então afirmamos que a cha-
                                                                                       ma é causa do calor, e o calor é seu efeito. A ideia
                                                                                       de causa e efeito, então, é derivada da experiência
                                                                                       de impressões particulares, que sempre se apre-
                                                                                       sentaram em conjunção, tal como o fogo e o calor.
                                                                                       Mas isso não significa que se trate de um princípio
                                                                                       racional, cuja validade seja necessária.

                                                                                       CAPÍTULO 13: EMPIRISMO: OS SENTIDOS E O CONHECIMENTO 155
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