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“Em outros termos: se sem conhecer as coisas em si                                                                                                             M.C. ESCHER’S “RELATIVITY” 2016 THE M.C. ESCHER COMPANY, HOLLAND
mesmas e sem saber o que é o bem e o mal, o belo e o feio, o
justo e o injusto, dispõe de um método especial de persua-
são que aos olhos dos ignorantes o faça parecer mais sábio
do que os entendidos. Ou será necessário conhecer essas
coisas, por havê-las aprendido antes de procurar-te para
estudar retórica? Se não for o caso, na qualidade de profes-
sor de retórica, nada terás de ensinar a quem te procurar, a
respeito desse assunto, pois não faz parte de tua profissão,
cumprindo-te apenas deixá-lo em condições de parecer às
multidões que conhece tudo isso, embora o desconheça, e
passe por homem de bem, ainda que não seja?”

   PLATÃO. Górgias. In: Protágoras, Górgias, Fedão. 2. ed. Belém: EDUFPA,
                                         2002. p. 145. (Coleção Platão Diálogos).

	↪	 Relativismo moral e valores                                                             ↑ Relatividade (1953), gravura de M. C. Escher. Nessa obra, o artista     JAMIL AHMED/XINHUA/ZUMA PRESS/IMAGEPLUS
    universais                                                                              explora a relatividade espacial. Em um desenho bidimensional,
                                                                                            por meio da perspectiva, ele trabalha com planos e centros de
      Embora a persuasão possa levar à crença sem                                           gravidade diferentes, possibilitando ao observador diversas leituras
conhecimento ou ao conhecimento, para Sócrates,                                             tridimensionais. Para os relativistas, os valores morais não são
os sofistas, incluindo Górgias, só se interessavam                                          absolutos e podem ser interpretados de diversas maneiras.
em convencer e não se importavam com a verdade.
Os sofistas falariam de tudo, sem conhecer nada,                                            Absolutismo
lidando apenas com a opinião.
                                                                                                  Os que se alinham nessa corrente argumentam
           “O homem é a medida de todas as coisas, das coisas                               que, se não houvesse valores morais objetivos, isto
    que são o que são, e das coisas que não são o que não são.”                             é, independentes do que pensa cada sujeito e que
                                                                                            aspiram à universalidade, não seria possível criticar
      PROTÁGORAS. In: GUTHRIE, William K. C. Os sofistas. São Paulo: Paulus,                qualquer conduta. Um indivíduo poderia cometer as
                                                                             1995. p. 173.  ações mais degradantes e não poderia ser repreendi-
                                                                                            do, pois essas ações não seriam classificadas como
      Essa declaração é atribuída a Protágoras e re-                                        “degradantes”. Isso inviabilizaria a vida em sociedade.
sume uma posição relativista. Se o ser humano é a
medida de todas as coisas, a verdade se torna relativa                                            Além disso, de acordo com os absolutistas, a preo-
a cada indivíduo, isto é, depende de sua interpretação                                      cupação ética está presente em todas as sociedades
ou percepção. Trata-se de uma visão subjetiva, ligada                                       humanas. Por isso, é possível dizer que há princípios uni-
a cada sujeito e sua experiência pessoal. Por exemplo,                                      versais, como “a sociedade deve cuidar das crianças”,
o mel pode parecer doce para alguns e amargo para                                           “deve-se proteger a vida humana” ou “é errado mentir”.
outros; um indivíduo sente frio ao perceber uma brisa,
enquanto outro sente calor, e assim por diante. Então,                                      ↑ Crianças em Peshawar, Paquistão, durante as comemorações do
o que é bom para determinada pessoa pode ser ruim                                           dia 20 de novembro, reconhecido pela Organização das Nações Unidas
para outra. Isso também acontecia com o justo e o                                           (ONU) como o Dia Mundial das Crianças. Foto de 2015. A proteção às
injusto ou o bem e o mal. Já para Sócrates e Platão, ao                                     crianças deve ser um princípio ético universal. Apesar disso, elas ficam
contrário, existia uma verdade (justiça ou bem) em si                                       extremamente vulneráveis em várias situações desencadeadas por
que, por ser independente do que cada pessoa pensa,                                         conflitos bélicos e pela desigualdade socioeconômica, entre outras.
deveria ser buscada por todos. Na reflexão ética, essas
duas posições (sofistas, de um lado, e, de outro lado,
Sócrates e Platão) são conhecidas como relativista e
absolutista. Até hoje, há divisão de opiniões sobre isso,
com defesas e ataques de ambos os lados.

Relativismo

      De acordo com os defensores do relativismo,
pessoas de culturas e de sociedades diferentes têm
ideias diversas acerca dos valores morais, como o
bem e o mal. Em uma mesma sociedade, os va-
lores também mudam com o tempo. O que antes
era considerado vergonhoso, hoje pode ser aceito
como louvável ou vice-versa. Há discordância sobre
o que é o bem e o mal também entre indivíduos de
uma mesma sociedade. Assim, não há juízos mo-
rais absolutos; todos são relativos ao indivíduo ou
à sociedade.

CAPÍTULO 4: A DESCOBERTA DO SER HUMANO E A VIDA EM SOCIEDADE: OS SOFISTAS                                                                                                                                                               49
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